Quando uma criança fez um homem chorar

Por Thiago Marcondes

Sábado, dia 26/03/2016: estava na praia, cidade da Caraguatatuba, e veio um menino pedir latinha. Diferente das crianças que sempre aparecem, esse tem um jeito mais acanhado, quieto. Educado, chegou com "bom dia". Não vestia roupa suja e falava um português correto. Aparentava ser uma criança que vai à escola.

As latas da mesa haviam sido retiradas, então fui até o garçom do quiosque e pedi para dar as que tivesse ao garoto. O garçom, simpático, mostrou um tonel onde haviam algumas e saiu. O garoto pediu ajuda e retirei as latas pra ele. Perguntei se tinha fome e com seu jeito tímido disse que não, mas aceitou um refrigerante após minha insistência.

Aquela situação me martelou o dia todo, pois como disse, o garoto fugia do padrão de crianças que geralmente recolhem latas na praia. Me sensibilizo com todas, mas essa, especialmente, mexeu comigo.

Domingo, dia 27/03/2016: o menino voltou e recebeu mais latinhas. Super educado brincou com os cachorros e se foi.

Apareceu, pois anda de uma ponta à outra para recolher o máximo de latas possíveis. Um menino, cuja idade não ultrapassa 10 anos, passou o sábado e domingo trabalhando (nem sei se devemos chamar de trabalho) ao invés de brincar como toda criança deveria fazer nessa idade.

Meus cunhados deram dinheiro e eu e minha esposa perguntamos se ele tinha comido ou se tinha fome. Encabulado, demorou para responder que comeu um pão e mal conseguiu falar que não havia almoçado. Eram cerca de 12h.



No quiosque foi providenciada uma porção de coxinha e um refrigerante e pedi para voltar em 15 minutos. Me desejou feliz páscoa. Enquanto eu estava na água ele voltou e conversou com a Carol, que soube seu nome. E, atencioso e recíproco, perguntou nossos nomes.

Ele agradeceu, disse que a mãe tinha medo de cachorro e por isso não foi lá, mas que estava muito agradecida. Falou, também, que não comeria ali para poder dividir com a mãe, que o aguardava na calçada.

Perguntou se a gente sempre viaja para Caraguatatuba, pois assim o veríamos por ali todas às vezes. Saiu, mas antes disso falou: "Que Deus abençoe vocês!"

Chorei! Chorei da primeira vez que o vi hoje cedo, pois não é justo uma criança trabalhar.

Choro enquanto escrevo esse relato, pois o que fiz foi algo paliativo, momentâneo. O menino voltará todos os dias para a praia para pegar latinhas e as pessoas que estavam por lá vão continuar com suas vidas.

Continuo chorando por me achar impotente e sem conseguir fazer algo para ajudar ou ao menos para entender a situação do menino.

Às vezes reclamo de coisas toscas e vem esse menino, com sorriso no rosto e totalmente educado, e me dá um tapa na cara. Começo a pensar na quantidade de coisas supérfluas que tenho e vejo que poderia ajudar de outra maneira, mas também não sei como.

A situação me abalou tanto que nem consegui perguntar para o menino se ele estuda, se a mãe trabalha de semana e aos sábados, domingos e feriados eles saem pelas praias para recolher latas e complementar a renda. Aliás, nem ao menos sei há uma renda.

Enfim, continuo chorando...

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